segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

Se eu fosse você, também não gostaria de mim

Durante pouco tempo fui mimado e tive tudo o que queria, confesso. Pra ser mais sincero ainda, não me lembro tão bem dessa época. O que me marcou mais foi o nascimento da minha irmã, minha eterna rainha. Aquela a quem eu serei devoto pelo resto da minha vida e eu jurei proteger desde que ouvi seu choro pela primeira vez.
Lembro bem da infância em Diadema.
Amizades que viraram artigos policiais e amigos enjaulados. Alguns deles comiam do almoço que minha mãe fazia. E, mesmo sendo toda atenciosa para com eles, jamais me deixou frequentar os mesmo lugares.
Graças a Deus.
A negona tem um sexto sentido que é quase sétimo.

A sua véia também deve ter. Resta saber se tu a ouviu como eu a minha ouvi.

Como todo moleque, joguei meu futebol nas quadras perto de casa. Arrumei minhas tretas - tudo bem que elas eram praticamente diárias. Releve -, mas sempre resolvi na rua. Não levei dor de cabeça pros meus pais. Pelo menos não nesse sentido.
Confesso que eu era folgado e marrento mesmo com esse tamanho todo.

Na escola, era 50-50. Até a quinta série, eu não sabia o que era uma "nota vermelha". Lembro de ter me sentido um lixo quando mostrei minha prova baseada em um livro pra minha mãe. O expressão dela de decepção me fodeu.
Chorei duas noites seguidas e prometi que jamais a veria fazer esse rosto de novo.

Não fiz, parceiro. Acredite.

Nunca quis prestar empatia para com ninguém, mas os meus eram meus e eu cuidava até quando estavam além do alcance. Até mesmo quando uma amiga batia na porta de casa, de madruga, aos 16 de idade, chorando por uma desilusão amorosa.
Graças que a mantenho comigo até hoje.

Vi homens incríveis deixarem esse mundo. Homens esses que uso como exemplo até hoje seja na paternidade, no meu comportamento para com os amigos, as mulheres, meus pais, no trabalho.

Tive três pais: seu Arnaldo, seu Antônio e seu Marcos. Só um ainda vive.

Aos 13, enfiei na cabeça que queria aprender a falar inglês após um certo ser humano ter me dito que eu jamais seria capaz.
Aos 20, depois de muito filme assistido três vezes, muita música gringa, muitos livros e muitos chats online jogando FIFA com ingleses, aprendi. Fiz meu primeiro teste numa empresa que exigia a língua em conversação.
Passei, mas não quis o emprego. Eu queria só o teste.
Não precisei de professor. Precisei de vontade. E isso, ah meu mano, isso eu tenho de sobra.

Entrei em três faculdades, larguei duas. Terminei curso que não queria fazer. Perdi tempo que não podia perder, mas, todos os dias, tento recupera-lo.
Impossível?
Só se for pra você.

A maioria das minhas amizades eram femininas. Fui chamado de viado por dormir em casa de amiga e "não fazer nada", fui taxado de gay pelas roupas que usava, mas aprendi que é muito mais importante entender as mulheres do que tê-las.

Traí. Fui traído. Superei ambos.

Usei droga e não gostei. Hoje sou viciado em nicotina após várias e várias tentativas frustradas de parar.

Me apaixonei mais de uma vez. Quebrei a cara, chorei também. Senti a dor da perda de uns amores aí, mas sempre vem outro depois e a gente continua sendo trouxa e sorrindo por incidência dessa dor gostosa do caralho que é o amor.

Sempre gostei de ouvir, mas gosto mais ainda de falar. Por isso arrumei refúgio nos textos e escrevo num blog que quase ninguém lê.
Vai entender.

Talvez isso seja mais pra mim que pra você.

Sobre meninas, olhos marejados e cabelos coloridos

Depois de muitos anos vivendo nesse mundo pobre de cores reais e quentes, é normal que passemos a criá-las em nossas mentes para que, de forma ilusória, tudo fique mais fácil de suportar. Assim são elas, as moças das cores: seres humanos necessitados de algo mais além da rotina.

Não as culpo.

Posso ousar e dizer que, até certo ponto, as invejo.
Inveja dessa simplicidade. Dessa pureza.

Quanto tempo faz, me diz, que você torce para que tudo dê errado só para, no final, vangloriar-se por ter tido razão? Vangloriar-se de um momento tão curto e insignificante quanto uma hora extra naquele emprego que você odeia.
Você não pode apedrejar o inconsequente sendo que queria ser igual, mas não o é por puro medo.

Elas são assim. Seres sem ou com bem pouco medo.

Entenda o seguinte: a inconsequência faz parte de todos nós, assim como o vício. A diferença está em como você encara cada um deles.
Você pode mandar prender o viciado em crack porque ele é uma ameaça "à paz e a convivência em sociedade". Ou, sei la, porque ce tem medo dele te roubar, te matar devido ao vício. Podemos agir como acusadores e apontar o dedo.
Sei lá.
Só que também existe a possibilidade de abraçar e ver que existe um ser humano atrás daquilo. Que é uma válvula de escape, um refúgio, uma força. Uma forma de enxergar-se forte e acima dos problemas. A única força possível em um mundo onde seu nome e sua fisionomia são sinônimos de fraqueza.
Você pode ser aquele que acredita que, atrás de toda a máscara, existe alguém que quer se visto. Notado. Impulsionado.
Que precisa de um impulso e que também chora. Que também sente tristeza apesar do que se vê.

Você pode ser essa mão que as eleva.
Os sábios escolheriam sê-la.
Talvez, uma vez na vida, todos nós possamos ser sábios.
Não acha?

E, passado indeterminado período, em algum momento, passamos a achar que somos nós quem as fizemos. Que as criamos.
Que nós somos os responsáveis por suas influências, lágrimas, lições aprendidas, seguranças. Medos.

Ah, como somos tolos.

Suas influências estão em tanta coisa.
Sabe aquilo que dizem: diga-me com quem tu andas que te direi quem és? Então. Elas já ouviram. Colou por um tempo. Mas entenderam que terceiros não fazem segundo que, por sua vez, não fazem primeiros.
Seus livros, lugares, paisagens e reflexões estão muito além de um pensamento quadrado e antiquado. O velho tem lugar em seu novo, mas o intolerante não faz morada em sua paciência.

A melhor coisa que se pode fazer é viver e ter a sorte de encontrá-las por aí em um momento qualquer.
Seja sempre o mais próximo do real possível. De ilusão já basta a vida cinza que você levava antes das cores chegarem.